Num futuro indeterminado, mas do qual não estamos longe, a massificação tecnológica deu origem ao puro entretenimento, impedindo o acesso dos cidadãos à informação e à criação de um espírito crítico e inquisitivo.
Publicado em 1953, Bradbury relata-nos um futuro em que o livro – fonte de conhecimento e pedra de toque do pensamento individual – está votado ao extermínio. Toda e qualquer informação é controlada e veiculada por um governo inominável, de origem desconhecida, omnipresente mas sem qualquer referência física.
Esta nova organização social inverte todos os papéis: os bombeiros, arautos da salvação da vida humana, estão condenados a desprovê-la de qualquer humanidade; os laços familiares e afetivos são inexistentes, trocados por uma socialização virtual televisiva, herdeira possível de uma qualquer rede social internáutica atual; e a ignorância imposta é apreendida como a felicidade desejada por todos os cidadãos.
Esta leitura traz-me ecos de outras leituras. Uma é Crowds and Power (1960), de Elias Canetti, onde este analisa o comportamento das multidões e dos bandos, e a forma como, por exemplo, a sua disposição e organização pode ser utlizada para a sua consequente manipulação. Questiono-me igualmente se a construção do herói Montag (segunda-feira) tem alguma génese no bom selvagem defoneiano Sexta-Feira, seu contrário. Por último, a reminiscência do poema pessoano da abençoada ceifeira ignorante.
Fahrenheit 451 / Ray Bradbury. - Porto : Público Comunicação Social [distrib.], imp. 2003. - 159 p. - (Mil folhas ; 66). ISBN 84-96200-92-2
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