Ler Ferreira de Castro 40 Anos Depois

Ler Ferreira de Castro 40 Anos Depois
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31.5.07

As dificuldades devem ficar nos seus locais restritos ou tendem a tornar-se problemáticas. E isso não queremos. Problemas há sempre. Em cada tempo e local. Com isso podemos nós bem. A situação torna-se complexa e problemática é quando resolvemos espalhar as pontas da meada entrelaçando-as e dificultando o seu embaraço. Cada fio um novelo que se arruma. Um emaranhado de fio, isso sim leva tempo a desvendar e consome a nossa ansiedade.

30.5.07

Faz hoje uma semana que me deitei contigo na cama. Ia dizer que dormi, mas não. Tão longe disso. E o deitar foi só porque sim. Quando muito rolámos numa superfície agradável que até era a tua cama. Tudo o resto foi quase nada. Nem decepção nem surpresa. Foi exactamente o que esperava e que se sabia ir acontecer.

Foi uma constatação e quando muito serás com certeza o primeiro homem a esquecer quando daqui a alguns tempos olhar para trás e pensar com quem deitei ou rolei ou dormi. Sei hoje que serás o primeiro a eclipsar-se da minha memória.

E se te escrevo é só para deixar algum tipo de registo, que a memória não acabe. Não te vou imortalizar. Não. Estou a penas a dar-te o beneficio da dúvida. Quando olhar para este escrito e tentar buscar uma cara para dar a estas palavras haverá pelo menos a dúvida: quem poderia ser. Seria mesmo uma cara ou apenas suma efabulação para uma folha. Um qualquer devaneio em que nos deixamos levar pelo ritmo de uma esferográfica azul noite.

29.5.07

Dialectos da diferença

Primeiro, Mel Gibson filmou em aramaico e latim, depois num dialecto maia. Depois Eastwood filma em japonês. Este ano a edição dos Oscares deu, mais do que nunca, protagonismo a filmes em língua estrangeira, com Babel e O Labirinto do Fauno. O mais curioso é a aderência do público norte-americano a estes filmes.

Estar receptivo a um filme noutra língua é estar receptivo ao outro e às suas diferenças. É aceita-las. Assim sendo, estarão os americanos, finalmente, mais receptivos em relação aos outros? Talvez sim… talvez o seu melting pot esteja finalmente a dar sinais de fusão e aceitação.

28.5.07

Cinema português na RTP

Um dos últimos programas do provedor do espectador da RTP foi dedicado ao cinema português, ou mais concretamente, pela sua quase ausência nas grelhas de programação da estação.

Para além das óbvias considerações feitas, como a pouca exibição de filmes nacionais, que quando existe é feita a horas muito tardias e sem uma adequada promoção das mesmas. O mais curioso foi que na noite anterior foi exibido o filme Coisa Ruim e dentro dessas moldes, tanto quanto me apercebi. Foi uma exibição tardia, mas talvez até se aplicasse ao teor do filme. Mas se a ideia é a de um maior alcance do número de espectadores, deveria ser mais cedo. Gostaria de ter visto o filme, mas após uma cansativa semana de trabalho o desejo de descansar era mesmo maior do que o de ficar a ver televisão noite dentro.

Tirando este, alguns dos últimos filmes que me lembro de terem sido exibidos, se a memória não me falha, tem sido aos domingos também tarde e véspera de início de semana de trabalho. Realmente, não sei bem quais são os princípios que norteiam os programadores da televisão estatal, mas creio que os seus critérios deveriam ser redefinidos. Todos os filmes começam realmente tarde. O que começa mais cedo é a lotação esgotada, isto é se não houver nenhum jogo de futebol antes. Mas antes de ser exibido qualquer filme temos sempre de dar tempo a um concurso, cujo formato já se está a tornar cansativo, e uma novela, que sinceramente não me apela, ou seja, antes das 23 horas nada.

É verdade que a RTP dedica as quartas ao cinema americano, os sábados da 2 a um cinema mais alternativo, mas os critérios de sexta e domingo desconheço. Sei que há relativamente pouco tempo foi transmitido também domingo à noite, bastante tardo o Alice de Marco Martins. Seria interessante dedicar um dia em exclusivo ao cinema português. E se possível sem as continuas alterações de horário que têm sido apanágio da RTP.

27.5.07

Há dias assim, em que todas as folhas são parcas para abarcar todas as palavras que não chegam para dizer o que vai por dentro.

25.5.07

Ela

Ela
é a face que não consigo esquecer
Um traço de prazer ou lamento
o meu tesouro ou o preço a pagar
Ela será a canção que o verão canta
o arrepio que o Outono traz
e será centenas de coisas diferentes
Num só dia

Ela
será a bela ou a besta
a fome ou o banquete
Pode transformar cada dia num céu ou num inferno
Ela pode ser o espelho dos meus sonhos
Um sorriso reflectido num ribeiro
Ela pode não ser o que parece
Dentro da sua concha

ela que parece sempre tão feliz na multidão
Cujos olhos são tão privados e orgulhosos
Ninguém os pode ver quando choram
Ela pode ser o amor que não tem esperança de durar
e chegar das sombras do passado
Que recordarei até morrer

ela
Pode ser a razão porque sobrevivo
O porquê e o objectivo da minha vida
Aquela que cuidarei nos anos bons e maus
vou pegar nas suas risadas e lágrimas
E transforma-las em todas as minhas recordações
Pois onde quer que vá, terei de ir
O significado da minha vida é
Ela ela ela

She, Elvis Costello

23.5.07

Conseguimos ser tão ridículos

Há um ministro que diz piadas e não acontece nada (também é verdade que não era uma piadas sobre hemofílicos). Há um professor algures que diz ou uma piada ou a verdade, que é transformada em insulto. Ou há dois pesos e duas medidas, que os há, ou há desculpas muito esfarrapadas para demitir as pessoas.

Quanto ao nosso ministro, esse soma e segue, agora foi a vez do aeroporto. Já ouvi muita explicação estapafúrdia, até já dei algumas, mas aquela caracterização da margem sul essa sim é ofensiva e insultuosa, quer para as pessoas, quer para a nossa capacidade intelectual.

E quem o demite?

22.5.07

É necessário criar e alimentar uma obsessão que defina o nosso carácter.

Eu tenho a minha obsessão que sendo ou não saudável é normal. Outros passaram por um processo semelhante e sobreviveram.

20.5.07

Nós que estivemos em lado nenhum no 25 de Abril de 74 vivemos uma dupla angústia: o termos ainda resquícios de uma mentalidade presa e o de não sabermos exactamente o que isso é.

19.5.07

O Labirinto do Fauno

O mais fascinante deste filme é o ser um hino à imaginação, mesmo que esta seja um escape a uma realidade brutal, incapaz de ser compreendida e apreendida na sua totalidade. É um dos mais belos trabalhos cinematográficos que já vi, não só pela temática, mas muito pela concepção e construção artística que nos oferece.

Todos os seres imaginários que povoam esta fábula são simultaneamente muito realistas na sua concepção, com pormenores soberbos. As fadas são espíritos da floresta, moldadas às suas características, e não seres luminosos e antropomórficos. Apenas adaptam essas características para melhor serem reconhecidas pelos humanos dignos de as observar. Os monstros atrás do armário ou debaixo da cama são papões com mãos e olhos aterradores (excelente trabalho de concepção). E nem mesmo as personagem “reais” deixam de ser autênticos monstros.

Há cenas de efeitos especiais excelentes, e não admira então que este filme tenha ganho três Óscares em categorias técnicas.

Recomendo a ver com muita atenção.

16.5.07

Apocalypto

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Ao ver este filme achei interessante o seu conceito de final de civilização, segundo o qual esta só é destruída por causas exteriores se no seu próprio interior estiver já fragilizado. Daí que o velho mito de que a civilização … foi destruída pela invasão espanhola não é cem por cento correcto, esta civilização estava já em declínio quando os espanhóis desembarcaram nas Américas.

O filme acompanha a corrida contra o tempo de um homem que, ao se aperceber que a organização do mundo tal como a conhece se perdeu para sempre, tenta salvar a todo o custo a vida da sua família nuclear, a única coisa que lhe resta. Esta corrida desenfreada, é uma corrida claustrofóbica e de terror captada sem genialidade mas com eficácia por Mel Gibson.

Quanto à questão da violência, é um filme violento sim. Quanto à sua gratuidade, tenho as minhas dúvidas: talvez não fosse necessário mostrar tantos pormenores, mas tento imaginar a época, a mentalidade e as situações e não acredito que estas fossem menos violentas.

15.5.07

14.5.07

Olhos de Cão Azul, Gabriel Garcia Marquez

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A minha primeira leitura de Gabriel Garcia Marquez foi De amor e Outros Demónios e gostei imenso. Desde aí são já alguns os títulos que li, sendo o último este conjunto de contos intitulado Olhos de Cão Azul. E realmente este título reveste-se de uma importância suma para o livro não como fio condutor temático mas como ambientador. Estabelece uma ambiência simultaneamente estranha e fascinante e que, no entanto, impõe sempre uma impossibilidade cujo limite máximo é a morte.

12.5.07

deus não é um nome

é uma esperança

um qualquer despontar verde entre cinza queimada

11.5.07

Rosa do Deserto

Sonho a chuva
Sonho jardins na areia do deserto
Acordo em dor
Sonho o amor enquanto o tempo escorre pelas minhas mãos
Sonhos amarrados a um cavalo que nunca se cansa
E nas chamas

As suas sombras formam o desejo de um homem
Na
rosa do deserto
Cada veú uma promessa secreta

Na flor do deserto
Não há perfume mais torturador que este
E enquanto se volta
Move-se na lógica de todos os meus sonhos
O fogo queima
Compreendo: nada é o que parece


Sonho a chuva
Sonho jardins na areia do deserto
Acordo em dor
Sonho o amor enquanto o tempo escorre pelas minhas mãos
Sonho a chuva
Olho os céus vazios sobre mim
Fecho os olhos, este perfume raro
É a doce intoxicação do seu amor


Nenhum outro perfume tão doce me intoxicou tanto
Doce rosa do deserto
Esta memória de éden que nos persegue
Esta rosa do deserto, este raro perfume
É a doce intoxicação da sua queda.

Desert Rose, Sting

10.5.07

nunca chegamos à Verdade

chegamos às pequenas verdades

que permitem prosseguir nos dias e nas noites

porque necessitamos sempre de uma luz

mesmo na ofuscante claridade

corrimões que nos amparem

na descrença do futuro

9.5.07

Falhar

a Samuel Beckett

falhar de novo
falhar novamente
falhar sempre e a cada momento

falhei porque ousei

7.5.07

I Want to Die Like Willem Dafoe

De quando em quando o cinema e os seus artistas prestam homenagem aos seus colegas através da paródia, escolhendo figuras conhecidas pela sua versatilidade que nem sempre jogam no campo do mainstream. É o caso de Queres ser John Malkovich? e do jogo Bacon’s 4th Degree, baseado na teoria dos seis graus de separação pela qual todas as pessoas no mundo estão ligadas, mas aplicada só ao mundo da sétima arte.

Mas também Willem Dafoe recebeu uma homenagem com que deparei no outro dia enquanto deambulava pelo Youtube. Chama-se I Want To Die Like Willem Dafoe e é uma paródia ao dramatismo da sua morte em Platoon. Mas poderia ser uma paródia às variadas e dramáticas mortes noutros filmes como: Viver e Morrer em L.A., imolado; Coração Selvagem, cabeça arrancada por tiro; XXX2, decapitado por comboio; Speed 2, já nem me lembro como; Última Tentação, crucificado. Há que admitir que morrer variada e drasticamente é com ele.

6.5.07

Alegria Breve, Vergilio Ferreira

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Iniciei a leitura deste livro porque era um dos poucos que tinha na prateleira para ler de um dos autores seleccionados no Curso Livre que ando a assistir.

Tendo já lido Para Sempre e Manhã Submersa, e tendo gostado de ambos, tudo parecia indicar que esta seria uma leitura agradável. No entanto, nem por isso. Ao contrário do seu título, foi uma longa e penosa leitura. Talvez o momento não tivesse sido o mais adequado para o fazer. Talvez não fosse a mais propícia conjunção espacio-temporal para mim.

Foi não ter gostado da história? Talvez não me identificasse com ela, sim. Foi a sua estrutura? Sim e não. Gostei da sua divagação temporal, não gostei do modo como se arrastava, ou assim me parecia, de um momento para outro. A cada página, a cada episódio dava por mim a divagar por outros pensamentos e sem me ser capaz de concentrar na narrativa. Daí que a leitura se arrastasse e arrastasse e arrastasse e não tivesse animo para a continuar.

5.5.07

Não sei o que hoje me aliviaria. Se o choro. Se o grito. Se simplesmente arrancar a alma.

Pressionar um botão e desligar-me de tudo por momentos, horas ou não sei… e bastaria?

Apenas hoje não estou bem aqui. Nem o estaria em qualquer outro lugar. Mas aqui, nesta tarde que se arrasta, não estou mesmo.

Queria de algum modo poder sair daqui. Deste lugar-momento. Virar esta página que com vontade própria permanece colada. Queria evadir-me de algum modo. E não sei se grite. Não sei se chore. Não sei se nada.

4.5.07

Palavra #12

Acanto - do Lat. acanthu ákanthos, acanto, s. m., Bot., planta espinhosa chamada erva-gigante; Arquit., ornato característico do capitel coríntio, feito à semelhança das folhas de acanto.

3.5.07

Dos Dias Inúteis

Os dias que passam não por nós, mas que vemos arrastando-se à nossa frente. Em que as horas se desenrolam demoradamente e a que assistimos sem mais fazer do que atentar a esse lento fluir. Sentados num sofá. Deitados numa cama. Parados à espera de nada.

2.5.07

Porque é que falhamos com aqueles que nos querem bem?

Pelo excesso de confiança que se sente ao saber que alguém nos quer bem. Esse saber dá-nos uma confiança que vai alargando os seus raios de acção e rompendo limites. Esquecemos que os nossos limites não são os mesmos dos outros e que mesmo gostando de nós há limites intransponíveis ou cuja transposição não passa indelével e sem consequências. Confia-se demasiado na capacidade de aceitação e perdão daqueles que nos querem bem.

Sabemos também os seus pontos fracos e sabemos melhor como contornar as suas debilidades e fraquezas e forçamos com eles o que não forçamos com mais ninguém.

1.5.07

Conta-me Com Foi…

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Acompanhar esta série tem sido bastante prazeiroso. Não só pela óbvia qualidade de produção em que cada pormenor é rigoroso e tudo conta, como pelo tom leve e cómico sem moralismos, realmente apenas de retrato se um período, como pelo relembrar das referências.

E este é realmente um grande triunfo da série: apelar a todas as referências de quem viveu a época e que faz com que todos nós nos revejamos naqueles personagens, em maior ou menor grau.

A acção tem lugar em 1968, ano escolhido pelos vários acontecimentos mundiais acontecidos e em que cada uma dá o mote ao episódio influenciando directa ou indirectamente a vida das personagens. 68 foi realmente um ano importante, inclusive na minha família, pois nasceu o meu irmão Luís. Eu nasci mais tarde, em 76, no entanto, reconheço muitas das referências, nomeadamente na caracterização e caricatura das personagens. A família de cinco, a presença da avó, as vizinhas, as expressões utilizadas, o constante exercício de esticar o dinheiro das famílias. Mesmo nascendo quase uma década depois e vivendo a infância sobretudo na década de 80, tudo aquilo para mim é muito verosímil.