Ler Ferreira de Castro 40 Anos Depois

Ler Ferreira de Castro 40 Anos Depois
Mais informações: www.cm-sintra.pt

31.12.11

2011/2012

Data, Sophia

José d'Almeida e Maria Flores
Tempo de solidão e de incerteza
Tempo de medo e tempo de traição
Tempo de injustiça e de vileza
Tempo de negação
Tempo de covardia e tempo de ira
Tempo de mascarada e de mentira
Tempo de escravidão
Tempo dos coniventes sem cadastro
Tempo de silêncio e de mordaça
Tempo onde o sangue não tem rasto
Tempo da ameaça

30.12.11

Toy Story 3 (2010)

O fim da infância acontece quando trocamos os nossos brinquedos por outros mais legítimos à nova maturidade e responsabilidades, seja sob a forma de novas tecnologias ou de novos hobbies, mas consideramos sempre essa despedida como um adeus unilateral. Ao oferecer-nos a vida dos brinquedos depois de desligarmos as luzes, a trilogia Toy Story devolveu-nos o sorriso inocente e de respeito por todos os brinquedos que nos acompanharam e com os quais crescemos e aprendemos o mundo. Num final bittersweet, fecha-se um ciclo na vida dos brinquedos mais famosos do mundo (Buzz, o casal Batata, Rex, Barbie, entre outros), quando estes percebem que o seu propósito não chegou ao fim com a ida de Andy, seu dono para a faculdade, pois têm em si o poder de fazer feliz outra criança e assim desenvolver novos laços de afecto sincero. O melhor final para esta ode à imaginação, que nos relembra que o infinito e mais à além estão ao nosso alcance.

Realização: Lee Unkrich * Argumento: John Lasseter e Andrew Stanton * Elenco (VO): Tom Hanks, Tim Allen e Joan Cusack

Poética, Vinicius de Moraes

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.


A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
- Meu tempo é quando.

29.12.11

Desabafos escatológicos

É a meio da manhã que costumo cagar. E assim o faço vai para 12, 13 anos. Antes não me lembro a que horas cagava, mas lembro-me de ter prisão de ventre – provavelmente, apenas me esquecia de cagar.
Não é que cague impreterivelmente todos os dias à mesma hora, afinal há dias em que outros afazeres se interpõem. Mas regra geral, a meio da manha lá me devaneio para o wc. É um processo rápido, de tão habituado e preparado que o corpo está. Cago e pronto, sinto-me pronta para o resto da manhã e preparada para acomodar algo mais lá pela hora de almoço.
Mas durante aproximadamente meia hora, sinto os intestinos reajustarem-se ao espaço agora livre, num processo de expansão e adaptação que por vezes me intriga e me deixa à espera que algum alien se escape das minhas entranhas.

Acima de qualquer suspeita, José Paulo Paes

a poesia está morta
mas juro que não fui eu

eu até que tentei fazer o melhor que podia para salvá-la

imitei diligentemente augusto dos anjos paulo torres car-
los drummond de andrade manuel bandeira murilo
mendes vladmir maiakóvski joão cabral de melo neto
paul éluard oswald de andrade guillaume appolinaire
sosígenes costa bertolt brecht augusto de campos

não adiantou nada

em desespero de causa cheguei a imitar um certo (ou
incerto) josé paulo paes poeta de ribeirãozinho estrada
de ferro araraquarense

porém ribeirãozinho mudou de nome a estrada de ferro
araraquarense foi extinta e josé paulo paes parece
nunca ter existido

nem eu

28.12.11

nenhuma amizade

Nada perguntei, porque nada me foi dito, mas como mulher percebo os olhares, sinto as mudanças de dinâmica, ouço os silêncios, e, acima de tudo, sei que se parece, nunca uma mulher fica impávida e serena.


À custa de algumas aprendizagens em primeira mão, sei que nenhuma amizade entre homem e mulher pode ser demasiado próxima. Entre a eventualidade de um dos lados extrapolar a amizade, há o fator cônjuge que analisa ao pormenor cada palavra, hesitação ou olhar e sente mesmo o que não está lá.

Com a idade é certo que isso alterou as minhas amizades masculinas, que, apesar de queridas, não são tão efetuosamente expressas, porque há uma distância entre o que é e o que parece à vista dos outros. Prezo, acima de tudo, os lares das amizades em que sou recebida e onde quero continuar a ser sem constrangimentos e em serenidade.

Foi uma aprendizagem à custa de alguns dissabores e é o tipo de aprendizagem que não se consegue transmitir, porque só se aprende à custa de arranhões.

Os poemas, Mário Quintana

Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto
alimentam-se um instante em cada par de mãos
e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhoso espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti…

27.12.11

2011: de A a (quase) Z

Amizades: ainda não foi este ano que restabeleci contatos, mas será um dos grandes desafios do próximo ano.

Blogosfera: uma fonte de aprendizagem diária, que me ajuda a manter a serenidade e a alimentar a alma.

Clube de Leitura do Museu Ferreira de Castro: um grupo acolhedor, bem disposto e um momento de partilha indispensável.

Desporto: com longas caminhadas e “quase” uma vontade de correr.

Escotismo: mais tempo, mais dedicação e o sentir que ainda há muito para dar.

Formação: à partida sem expectativas nesta área, revelou-se um ano frutífero.

Geocaching: uma brincadeira entre amigos que se pode vir a tornar um vicio.

Incógnita: o que nos espera em 2012.

Juventude: a eterna questão, o eterno desafio.

Quilometragem: sem esperar foram cerca de 170, este ano espera-se 200.

Leituras: 27, numa média de 12 livros mês.

Mudanças: com receio, mas ansiosa.

Óculos: já há muito a necessitar, no verão renovei o look.

Participação juvenil: como, onde, com quem. Uma das aprendizagens do ano.

Resmas de listas: the sene of a purpose.

SIADAP: a caixa de Pandora para 2012.

Things we forget: para perspectivar o futuro.

Whishes (101 em 1001): lá vai andando devagar e aumentando depressa. Afinal, há tanto que ainda não se fez.

Ypsilon: sempre a aprender.

Drumundana, Alice Ruiz

Krzysztof Izdebski
e agora maria?

o amor acabou
a filha casou
o filho mudou
teu homem foi pra vida
que tudo cria
a fantasia
que você sonhou
apagou
à luz do dia

e agora maria?
vai com as outras
vai viver
com a hipocondria

[Navalhanaliga, 1980.]

26.12.11

Equívoco, Alice Ruiz

tudo
que
está
vivo
parece
parado


a
folha
morta
ao
cair
parece
viva

The Gospel (2005)

Interessante drama musical que aborda a vida e ambições de dois homens jovens numa comunidade negra evangélica e a forma como vivem a fé, da palavra à acção. Oportunidade para observar o trabalho de Idris Elba, que ganhou notoriedade pelo protagonismo da série britânica Luther.

Realização e Argumento: Rob Hardy * Elenco: Boris Kodjoe, Nona Gaye e Idris Elba

25.12.11

happy end, Cacaso

o meu amor e eu
nascemos um para o outro
agora só falta quem nos apresente

A culpa é da maçã


A Eva lixou-se (e lixou-nos).
A Branca de Neve foi o que se viu.
O Newton foi outro.
O Jobs não se safou.

Quanto a mim? São reinetas e em tarte, sff.

24.12.11

Um Conto de Natal (2009)

O clássico de Dickens recebe uma nova roupagem através da animação digital, onde imperam a qualidade dos efeitos e o realismo das feições dos actores que dão voz à história, embora ainda transpareçam uma plasticidade keniana. Foi bom rever esta história de redenção, em que um velho rico e avarento é visitado, na véspera de Natal, pelos espíritos do passado, presente e futuro (que ainda depende de nós).

Título original: A Christmas Carol * Realização: Robert Zemeckis * Argumento: Robert Zemeckis, baseado no romance homónimo de Charles Dickens * Elenco (VO): Jim Carrey, Gary Oldman e Colin Firth

A propósito de estrelas, Adília Lipes



Não sei se me interessei pelo rapaz
por ele se interessar por estrelas
se me interessei por estrelas por me interessar
pelo rapaz hoje quando penso no rapaz
penso em estrelas e quando penso em estrelas
penso no rapaz como me parece que me vou ocupar com as estrelas
até ao fim dos meus dias parece-me que
não vou deixar de me interessar pelo rapaz
até ao fim dos meus dias
nunca saberei se me interesso por estrelas
se me interesso por um rapaz que se interessa
por estrelas já não me lembro
se vi primeiro as estrelas
se vi primeiro o rapaz se quando vi o rapaz vi as estrelas

[Um jogo bastante perigoso, 1985]

23.12.11

FALSO DIÁLOGO ENTRE PESSOA E CAEIRO, José Paulo Paes

- a chuva me deixa triste…

- a mim me deixa molhado
Ubi Bava

A Princesa e o Sapo (2009)

Quando o conto da cigarra e da formiga se funde com o tema de A Bela e o Monstro resulta: A princesa e o Sapo.

Na Nova Orleães, algures na década de 20 do século passado, uma jovem esfalfa-se a trabalhar para cumprir o seu sonho de infância: ter o seu restaurante. Nesse percurso, conhece um sapo, nada mais do que um príncipe deserdado que acaba enfeitiçado pelo voodoo. Em vez de quebrar o feitiço com o famoso beijo, também ela fica enfeitiçada, vivem os dois várias aventuras, mas lá terminam, com o amores para sempre, juntos e cumprindo os seus sonhos, ela de ter um restaurante e ele de tocar jazz.
Longe de ser um qualquer marco na animação, permite-nos algumas reflexões:
- ao adoptar uma protagonista negra e um herói indiano, indica o peso destes dois públicos, quer no mercado americano, quer a nível mundial. Seria interessante perceber o impacto desta escolha junto destes públicos.
- mais do que o provérbio: quem feio ama, bonito lhe parece, que parece estar na génese destas histórias (A Bela e O Monstro incluída), está subjacente o conceito de que homem feio mas rico tem sempre uma mulher bonita. logo, a beleza é um bem que pode adquirir e/ou uma moeda de troca.
- os príncipes Disney são uns desocupados, que se limitam ser príncipes e bonitos, não tendo sequer a responsabilidade real de governar um reino.
- as futuras princesas são, muito modernamente, umas plebeias trabalhadoras e dotadas de uma beleza encantadora. (Volta Rapunzel, estás um bocado aperdoada.)

Título original: The Princess and the Frog * Realização e Argumento: Ron Clements, John Musker * Elenco (VO): Anika Noni Rose, Keith David e Oprah Winfrey

22.12.11


Sabe aquilo de errado que as pessoas julgam que fizemos? É exatamente o que elas costumam fazer... Os olhos só enxergam do lado de fora o que vêm do lado de dentro.
Aíla Sampaio
Anka Zhuravleva
Cansada das pessoas

mudei para o vazio
com vista por uma fresta
para o céu azul
e no silêncio
assustou-me
a minha companhia.

21.12.11

Histórias Falsas, Gonçalo M. Tavares

O título deste volume de pequenos contos é tudo menos enganador e o objectivo desta “falsidade” é explicado numa breve nota do autor: “tinha curiosidade em perceber o modo como a ficção (verosímil ou nem tanto) se pode encostar suavemente a um fragmento da verdade até ao ponto em que tudo se mistura e se torna uniforme.”
É desta forma que o autor pega em figuras ligadas à filosofia, história e literatura e constroi as suas histórias “reais” à margem do que viriam a ser as suas histórias míticas e/ou históricas. Ou seja, é um exercício da utilização da verdade/verosimilhança, como estratégia da ficção.
Em termos técnicos, apreciei a dupla utilização dos dois pontos, pois já muitas vezes senti essa necessidade de expressão, que evitei por formalismos linguísticos, mas que um destes dias irei experimentar sem remorsos. Apreciei também as suas abundantes frases conceptuais, que parecerem encerrar uma verdade inquestionável), quase impossíveis de alterar linguisticamente, e que sintetizam a vasta e profunda cultura deste autor, que tem granjeado prémios e novos leitores por todo o mundo.

Outras leituras deste autor:
Senhor Brecht
Senhor Juarroz

Oficina irritada, Carlos Drummond de Andrade

O Muro, Pedro Morales
Eu quero compor um soneto duro
como poeta algum ousara escrever.
Eu quero pintar um soneto escuro,
seco, abafado, difícil de ler.

Quero que meu soneto, no futuro,
não desperte em ninguém nenhum prazer.
E que, no seu maligno ar imaturo,
ao mesmo tempo saiba ser, não ser.

Esse meu verbo antipático e impuro
há de pungir, há de fazer sofrer,
tendão de Vênus sob o pedicuro.

Ninguém o lembrará: tiro no muro,
cão mijando no caos, enquanto Arcturo,
claro enigma, se deixa surpreender.

20.12.11

Quatorze Versos, Alexandre O’Neill

O primeiro é assim: fica de parte.
No segundo já posso prometer
que no terceiro vai haver mais arte.
Mas afinal não houve… Que fazer?

Melhor será calar, pois que dizer
nem do sexto conseguirei destarte.
Os acentos errados é favor não ver;
nem os versos errados, que também sei hacer…

Ó nono verso porque vais embora
sem que eu te sublime neste décimo?
Ao décimo-primeiro dediquei uma hora.

Errei-o. Mas que importa se a poesia,
mesmo que o não errasse, já não vinha?
É este o último e, como os outros, péssimo…

Mulher com Cão Procura Homem com Coração (2005)

Este filme marca o encontro entre John Cusack e Diane Lane, ele já com um longo rol de comédias românticas no currículo e ela mais dada a romances cinematográficos mais maduros. O enredo explora os meandros da busca do amor através da internet, tema recorrente na filmografia norte-americana deste género cinematográfico. O par romântico, a tentar superar antigas relações, vê-se empurrado por amigos e familiares a inscrever-se em sites de relacionamentos. A criação de perfis e a sua veracidade, a publicidade pessoal, os primeiros encontros e as suas expectativas, as (não) químicas, as surpresas, e os (des)encontros originam momentos engraçados que culminam num final demasiado óbvio. Uma temática actual para românticos inveterados.

Título original: Must Love Dogs * Realização: Gary David Goldberg * Argumento: Gary David Goldberg, baseado no romance homónimo de Claire Cook * Elenco: Diane Lane, John Cusack, Dermot Mulroney, Christopher Plummer, Stockard Channing e Elizabeth Perkins

19.12.11

O Caso Farewell (2009)

Com o objective de reformar o estado soviético, uma alta patente russa decide revelar segredos através de desenxabido diplomata francês. O culminar desta revelação, que favorece sobretudo os EUA, será alista de todos os agentes infiltrados em terras americanas.
Produção francesa, falada em três línguas, tem como curiosidade a presença de Kusturica como actor e juntar actores devárias nacionalidades

Título original: L'affaire Farewell * Realização: Christian Carion * Argumento: Christian Carion, Eric Raynaud * Elenco: Emir Kosturica, Alexandra Maria Lara, Willem Dafoe, Fred Ward e Guillaume Canet

Lua Adversa, Cecília Meireles

Peter Coulson
Tenho fases, como a lua
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!
Não me encontro com ninguém
(tenho fases como a lua...)
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...

18.12.11

Os Indesejados (2009)

Após a morte da sua mãe, e depois de um internamento por depressão, uma jovem regressa a casa ppara junto da irmã e do pai, que entretanto tornou a casar com a antiga enfermeira da mãe. A adaptação à nova realidade é conflituosa e nem tudo é o que parece.

Título original: The Uninvited * Realização: Charles Guard, Thomas Guard * Argumento: Craig Rosenberg, Doug Miro * Elenco: Emily Browning, Arielle Kebbel, Elizabeth Banks e David Strathairn

Há palavras que nos beijam, Alexandre O'Neil

Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca,
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto,
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas, inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído,
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

17.12.11

Inventário Nacional do Património Imaterial


Capeia arraiana: pega ao forcão
 Decorreu no passado dia 12, no Museu Nacional de Etnologia, o Colóquio Inventário Nacional do Património Imaterial: desafios e perspectivas. Com o objectivo de divulgar esta nova ferramenta de registo e preservação, este serviu igualmente para assinalar a primeira inscrição de uma manifestação cultural: a capeia arraiana.
Foi uma oportunidade para aprender (desconhecia o que era a capeia arraiana), rever e aprofundar conceitos e temas e perceber novas ligações com do passado com os actuais ritmos do mundo. É um pouco difícil fazer uma síntese de tudo o que foi dito, mas talvez seja relevante salientar, de forma sintética e não literal, algumas participações e contributos.

O bem inventariado e/ou classificado não o é para sempre. Este é um ponto de partida com vista à manutenção e preservação deste património. Estes processos são sempre inacabados e não são lineares, nem consensuais.
João Carlos Brigola, Director do Instituto dos Museus e Conservação

O turismo e a cultura são formas de combater o envelhecimento e o empobrecimento das populações rurais. As actividades singulares e únicas são fatores de atratibilidade e uma forma de combater o urbanismo.
Norberto Manso, Câmara Municipal do Sabugal

O inventário é um mecanismo de documentação, estudo e investigação, e uma forma de protecção legal, bem como de valorização.
Paulo Ferreira da Costa, Director do Departamento de Património Imaterial do Instituto dos Museus e Conservação

O Amor é o Amor, Alexandre O'Neil

Kiss, Man Ray
O amor é o amor — e depois?!
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?…

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar.
Num leito
há todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor
e trocamos — somos um? somos dois?
espírito e calor!

O amor é o amor — e depois?

16.12.11

“Não é que eu seja fútil: eu nem queria ser admirada pela beleza. Só não queria ser rejeitada e só não queria me rejeitar por conta da aparência.”
Anónima
Edward Hopper

O Estranho Caso de Benjamin Button (2008)

Há cerca de um ano, li o conto homónimo de Fitzgerald que deu origem ao enredo deste filme. Assim, foi impossível observar o filme sem tecer comparações a esse ponto de referência. A maior diferença entre os dois é que o conto se centra na inverosimilhança de uma situação (o nascer “ao contrário”), enquanto o filme explora o impacto dessa situação nos afectos na vida de Benjamim Button. Deste modo, o filme é acima de tudo a história dos amores de Button pela sua mãe adoptiva e por Daisy. As peripécias de vida de Button, como canta Carlos Paião, “vão dar jeito para aprender, para viver o seu grande amor” em plenitude e também para lhe dar a serenidade e maturidade para reconhecer que essa plenitude depende de uma finitude. Ou seja, apenas um amor não cumprido na sua totalidade pode sobreviver aos seus intervenientes.
Como já tenho afirmado, é quase impossível ver um filme, sem observar referências ou paralelismos com outros. Neste caso, o paralelismo mais flagrante são com Uma segunda Juventude, de que li o livro e vi o filme. Não só pela temática da luta/ engano do corpo em relação ao seu natural desenvolvimento e envelhecimento, mas porque nos livros as relações amorosas, embora importantes, são episódios, e nos filmes são o fio condutor do enredo e de grande parte das reflexões. Sem esquecer que ambas as tramas sucedem aproximadamente num mesmo tempo histórico. Outro piscar de olhos cinematográfico é feito com pela participação de Júlia Ormond, que em 1994, partilhou uma destas histórias de amor impossíveis com Brad Pitt em Lendas de Paixão.

Título original: The Curious Case of Benjamin Button * Realização: David Fincher * Argumento: Eric Roth (baseado no conto de F. S. Fitzgerald) * Elenco: Brad Pitt, Cate Blanchett, Tilda Swinton, Taraji P. Henson e Júlia Ormond

15.12.11

Hoje, obtive uma pequena vitória profissional. 

Erro de português, Oswald de Andrade

Totem, Patricia Ariel
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português.

14.12.11

Estás só. Ninguém o sabe., Ricardo Reis

Robert Gligorov
Estás só.
Ninguém o sabe.
Cala e finge.
Mas finge sem fingimento.
Nada ‘speres que em ti já não exista,
Cada um consigo é triste.
Tens sol se há sol, ramos se ramos buscas,
Sorte se a sorte é dada.

2 amas de gravata

Dois amigos e sócios, à beira de conseguirem o negócio das suas vidas, vêem-se confrontados com a necessidade de tomar conta de duas crianças, filhas de um deles, e cuja existência era desconhecida até ao momento. Este desafio vem alterar as suas vidas e provocar uma mudança nos seus valores e prioridades.
Filme despretensioso, bem servido pela inequívoca veia cómica da dupla Williams e Travolta, embora não seja um filme extraordinário. Bom para um fim de semana à tarde.

Título original: Old Dogs * Ano: 2009 * Realização: Walt Becker * Argumento: David Diamond, David Weissman * Elenco: Robin Williams, John Travolta, Seth Green e Kelly Preston

13.12.11

The Drowned Glass, Alberto Guerrero
Os poemas
fazem-se, às vezes,
das sobras da luz,
do que os dias desdenham
e deixam para trás.

É nessa fermentação imprecisa
que sobem à tona
algumas palavras, ou sílabas ainda,
sons sem-abrigo, interpostas figuras
de esquivos sentidos.

Os poemas
fazem-se, às vezes,
do olhar faminto das raízes
que crescem da página
à procura de mãos,
ou de uma morada certa.

ivone Costa

Heidi178

Bem, finalmente estou registada no Geochaching. A partir de agora, já posso registar-me nas caixas que faça. Infelizmente, já ficaram para trás algumas 10 caixas sem registo. Mas sem remorsos. E a primeira caixa a fazer, há de ser: a árvore da Borracha.

12.12.11

Leite, leitura
letras, literatura,
tudo o que passa,
tudo o que dura
tudo o que duramente passa
tudo o que passageiramente dura
tudo, tudo, tudo
não passa de caricatura
de você, minha amargura
de ver que viver não tem cura

Paulo Leminski
Paul Kelley, Bonecas

A virgem e o cigano, D. H. Lawrence

Esta novela acompanha o deslumbramento de uma jovem por um homem cigano e ser de base para reflexões sobre o papel da mulher na sociedade (as suas expectativas relativamente ao casamento, à maternidade, a feminilidade e sensualidade naturais por oposição aos constrangimentos sociais), o outro e o seu estigma e o estigma de hereditariedade (pecados dos pais). Um pequeno livro que se lê bem.

11.12.11

Amor , Honra e Guerra

À beira da Segunda Guerra Mundial, uma proeminente família chinesa confronta-se com os contrastantes conceitos de tradição, comunismo e pensamento ocidental, enquanto tenta perceber o significado pessoal e social do mais importante dos sentimentos: o amor. É este que serve de mote para que esta família questione o seu papel, quer familiar, quer social, e o que se espera de si enquanto individuo.
O enredo, baseado num romance da nobelizada Pearl S. Buck, é interessante e explora, sobretudo, o papel da mulher n(um)a sociedade em incontornável mudança. Os interpretes são maioritariamente desconhecidos do grande público, à excepção de Jonh Cho, num registo longe dos habituais patetas adolescentes, e Willem Dafoe, num registo sem surpresas, mas que mostra a sua versatilidade.

Título original: Pavillion of Women * Ano: 2001 * Realização: Ho Yim * Argumento: Yan Luo, baseado no romance de Pearl S. Buck * Elenco: Willem Dafoe, John Cho, Yan Luo e Sau Sek

AQUI ESTÁ MINHA VIDA , Cecilia Meireles

Yemanjá, Patricia Ariel
AQUI ESTÁ MINHA VIDA – esta areia tão clara
com desenhos de andar dedicados ao vento.
Aqui está minha voz – esta concha vazia,
sombra de som curtindo o seu próprio lamento.
Aqui está minha dor – este coral quebrado,
sobrevivendo ao seu patético momento.
Aqui está minha herança – este mar solitário,
que de um lado era amor e, do outro, esquecimento.

10.12.11

Adeus, Eugénio de Andrade

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um
Aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.

A minha vulnerabilidade

Lucretia, by Gabrielle Bakker
O que me faz sentir vulnerável? Nunca me senti bonita. Talvez por dentro, mas vivo sob a hipocrisia da imagem e nesse campo de batalha sinto-me perdedora.
A verdade é que o tempo passa e devemos ser mais sábios, mas isso não implica que consigamos curar ou ultrapassar as nossas dores. Aprendemos a conviver com elas, mas não as pomos necessariamente para trás das costas: são a cicatriz que nenhuma operação elimina.
Desenvolvi estratégias de diversão, aprendi a ser o centro das atenções, surpreendendo com o humor e a conversa aparentemente profunda, mas bem no fundo, apenas quero ser bonita aos olhos dos outros. O que vejo no espelho talvez seja verdade, mas as fotos nunca me fazem justiça e assumo como essa a imagem que os outros têm de mim. E não há artimanhas que o escondam. Seria talvez mais feliz sem sabe o que vêem de mim, pois não consigo acreditar que belas palavras me sejam ditas, inspiradas ou atribuídas. A minha vulnerabilidade é a beleza que não possuo.

9.12.11

Eva, Carlos Nejar

Adrien Borda
A culpa toda
me reveste
e eu nua.

Ouvi o que
a serpente
sussurrava
e caí.
Com Adão.

Nos desterrou
o anjo.
Era o conhecimento
de um pudor
ou soluço.

O que pode
a dor,
se nenhum traço
nos julga?

Com medo,
escondo a face.
E opaco, nulo
o riso. Tudo
é desconhecido
fora do paraíso.

visto no Silva

A Tempo e Horas

Dos criadores de A Ressaca, temos mais uma comédia sobre male bounding, por vezes incompreensível para o universo feminino, posto à prova em situações inusitadas (e que soam quase sempre forçadas). A história é esta: um executivo reservado (Downey, Jr) é obrigado a fazer uma road trip com um aspirante a actor (Galifianakis), de modo a poder presenciar o nascimento do seu filho, durante a qual acontecem as mais variadas peripécias. O filme arranca-nos gargalhadas, mas não nos conquista por completo.

Título original: Due Date * Ano:2010 * Realização: Todd Phillips * Argumento: Alan R. Cohen, Alan Freedland * Elenco: Robert Downey Jr., Zach Galifianakis e Michelle Monaghan

8.12.11

A Múmia 3: O Túmulo do Imperador Dragão

Com Indiana Jones aparentemente reformado, era necessário um herói humorado, másculo, inteligente e que transita-se entre o meio académico e a aventura física. Esse herói coube a Brendan Fraser, cuja cara de bom rapaz, que qualquer mãe gostaria para genro, não é o sifiente para se firmar como herói de acção.
Desta feita, a múmia volta a atacar, mas na china, pela mão de Jet li, um dos vilões preferidos de Hollywood. O enredo é mais do mesmo e a diferença acaba por ser o cenário. Impagável continua a ser John Hannah, na sua personagem azarenta.

Título original: The Mummy: Tomb of the Dragon Emperor * Ano:2008 * Realização: Rob Cohen * Argumento: Alfred Gough, Miles Millar * Elenco: Brendan Fraser, Jet Li, Maria Bello e John Hannah

LULJETA LLESHANAKU

Quando pela primeira vez olhei uma pintura verdadeira
dei alguns passos atrás instintivamente
sobre os calcanhares
procurando o local exacto de
onde pudesse explorar sua profundidade.

Foi diferente com as pessoas:
Construi-as,
amei-as, mas não cheguei a amá-las plenamente.
Nenhuma chegou tão alto quanto o tecto azul.
Como numa casa inacabada, parecia haver uma folha de plástico por cima delas,
por vez do telhado
no princípio do outono chuvoso da minha compreensão.

7.12.11

a máquina de fazer espanhóis, valter hugo mãe

Esta foi a minha segunda incursão pelo trabalho deste autor, tendo a primeira sido o remorso de baltazar serapião, que me surpreendeu pela recriação de uma época, pelas personagens e pela violência. Já há algum tempo que tinha vontade de voltar à sua obra, da qual tenho seguido as repercussões via internet, através, por exemplo, do seu blog Casa de Osso e da sua participação na FLIP deste ano. O que me leva a constatar que este autor é também fruto do nosso tempo, em que os escritores não se limitam apenas ao labor da escrita, mas são elementos fundamentais no marketing da própria obra. A ação desta máquina… é centrada no lar feliz idade, casa final da vida de 93 idosos e palco das suas últimas desventuras e, sobretudo, memórias. Aqui, sabendo que o seu futuro é limitado, é a memória que ocupa o grande palco da obra e que permite a reflexão sobre identidade (pessoal e nacional), sentimentos, e liberdade (física -limites do corpo-, política e psicológica).
Uma obra a seguir com atenção.

Os poemas que escrevas, José Bento

CJ Burton
Os poemas que escrevas,
ainda que muitos, são
um só, inacabável,
interceptado um dia:

sufocante abertura
por onde irás descendo
a um poço, uma vertigem,
com uma única saída

que, enfim, vislumbrarás
quando já não tiveres olhos.

in Sítios, Assírio & Alvim

6.12.11

Diálogo Budista

Fui convidada para assistir, ontem, a uma reunião de diálogo da prática budista SGI. À parte das práticas, o diálogo foi interessante e relaxante.
Pela minha compreensão superficial desta prática espiritual, esta é uma orientação/filosofia de vida, que visa dotar o individuo de capacidades e competências para ultrapassar as dificuldades e atingir a felicidade quotidiana. Ou seja, não difere da postura de outros movimentos espirituais ou de capacitação e empoderamento do ser humano.
Volto a reafirmar, do meu contacto superficial, pareceu-me que uma das linhas orientadoras é exatamente a do diálogo, que permite apreender novas perspectivas para resolver e ultrapassar obstáculos. Esta é uma das minhas grandes falhas, pois quando me vejo confrontada com dificuldades, regra geral, escudo-me num mundo só meu.
Não considerei esta postura inovadora, é uma forma de fazer o percurso, defendendo a importância de o percorrer, em desprimor de chegar a um qualquer ponto definido. Ao fazê-lo, desafia o individuo a sair da sua zona de conforto, a mudar atitudes e comportamentos. Ou seja, é mais uma forma de fazer as coisas, uma resposta que pode ser adequada a muitos, mas não necessariamente a única.
Alexander Mcqueen
“Calar-se equivale a deixar crer que não se julga e que nada se deseja; e, em certos casos, isso equivale, com efeito, a não desejar coisa alguma” (Sophia de Mello Breyner, 1919-2004).

5.12.11

Clube de Leitura do Museu Ferreira de Castro - Calendário 2012

Como é do vosso conhecimento, ou não, integrei este ano um Clube de leitura, um objectivo de há muito. Tem sido uma experiência muito enriquecedora, pelas leituras, pela partilha de experiências, de visões, de histórias, por tudo. Por isso, quero também partilhar convosco o calendário de leituras do Clube de Leitura do Museu Ferreira de Castro para 2012 e convidar todos os interessados a integra-lo ou a seguir alguns das partilhas através do blogue http://www.acurvadoslivros.blogspot.com/. Apareçam!

Janeiro, 6 – Histórias Falsas, de Gonçalo M. Tavares (Leya Bis).
Fevereiro, 3 – Ecos da Semana – A Arte, a Vida e a Sociedade, de Ferreira de Castro (CEL – Centro de Estudos Libertários).
Março, 2 – Fahrenheit 451, de Ray Bradbury (Publicações Europa-América).
Abril, 13 – A Cotovia, de Deszö Kosztolánnyí (Publicações Dom Quixote).
Maio, 4 – Os Capitães da Areia, de Jorge Amado (Leya Bis).
Junho, 1 – O Riso de Deus, de António Alçada Baptista (Editorial Presença).
Julho, 6 – O Idiota, de Dostoievski (Editorial Presença).
Setembro, 7 – As Pupilas do Senhor Reitor, de Júlio Dinis (Biblioteca Ulisseia de Autores Portugueses; Editorial Verbo; Publicações Europa-América; Porto Editora).
Outubro, 5 ou 12 (conforme seja ou não feriado) – Anno Domini 1348, de Sérgio Luís de Carvalho (Câmara Municipal de Sintra).
Novembro, 2 – Os Olhos de Ezequiel Estão Abertos, de Raymond Abellio (Editora Ática).
Dezembro, 7 – Manual de Pintura e Caligrafia, de José Saramago (Editorial Caminho).
Aqui tens o teu blogue.
Mas que fazes tu com ele?
Dás-lhe sentido que sobre
ou ficas só com a pele

das coisas abandonadas,
do que ninguém vai cuidar,
esperando madrugadas
de que possamos falar?

Aqui tens a tua voz.
Somos inteiros e sós.

Poema de Luis Filipe Castro Mendes no seu blogue Tim Tim no Tibete,

4.12.11

American Dreamz

A nova temporada do concurso musical American Dreamz é a oportunidade utilizada para reabilitar a imagem do presidente dos EUA, vítima de depressão, e que questiona o seu papel como líder de um país, sempre dependente das decisões dos seus conselheiros, personificados na personagem de Willem Dafoe. É uma sátira aos concursos televisivos, e à sua suposta construção de carreiras; aos meandros da política e ao terrorismo, que constrói inimigos necessários; aos sonhos, pessoais e da comunidade que nos rodeia. Hugh Grant agrarra uma personagem que nos recorda a sua prestação em Música e Letra e Dafoe é o “vilão”, desta feita sem mortes drásticas.
Título original: American Dreamz * Ano: 2006 * Realização: Paul Weitz * Argumento: Paul Weitz * Elenco: Hugh Grant, Dennis Quaid, Mandy Moore, Chris Klein e Willem Dafoe
Um homem, uma palavra. Uma mulher, um dicionário.

Provérbio alemão

3.12.11

NASCEMOS PARA O SONO

Nascemos para o sono,
nascemos para o sonho.
Não foi para viver que viemos sobre a terra.
Breve apenas seremos erva que reverdece:
verdes os corações e as pétalas estendidas.
Porque o corpo é uma flor muito fresca e mortal.

Poema mexicano do ciclo Nauatle mudado para português por Herberto Helder.