Um dos
primeiros choques foi ter de deixar a minha casa. Não era grande, era um
pequeno t2 que satisfazia as minhas necessidades. Mas a renda e as despesas
correntes iriam por em causa as minhas economias. Vi-me obrigada a cessar o
contrato e a procurar um quarto acessível e com o mínimo de condições. Não me
posso queixar, estou em casa de um casal idoso que me trata bem e até respeita
a minha privacidade, o mesmo já não posso dizer da família, que está à espera
que a qualquer momento roube seja o que for que consideram ser de valor em casa
dos velhotes. Mas habituada a dispor do meu espaço e dos meus horários a meu
belo prazer, tive de transformar os meus hábitos e hoje sou mais votada à
reclusão.
Deixei de
gastos que hoje chamo fúteis porque não me alimentam o corpo, mas alimentavam-me
a alma. Nunca mais fui ao teatro, nem ao cinema, concertos, visitas. Tudo ficou
para outro plano e outro futuro. Restam-me alguns passeios, a biblioteca
pública e os filmes de fim-de-semana à tarde na televisão. Acabaram-se os
jantares amigáveis, acabaram-se inclusive algumas amizades, que talvez não o
fossem. Talvez fossem apenas exibições de gostos comuns ou de gostos sociáveis,
ou outro adjectivo que agora me falhe. Acabou-se as roupas novas mensais,
restam-me os saldos e promoções e só ocasionalmente.
Acabou-se
tanta coisa, que o meu sorriso, embora sincero, agora, é apenas triste.
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