Neste momento, a minha casa não é um lar. É apenas a casa onde coabitam duas pessoas que, apesar dos laços familiares, não conseguem ser uma família. O que nos prende é o sentido do dever e não sentirmo-nos uma família. Nenhum de nós tem coragem ou força ou sabedoria para dar volta à situação.
Somos os dois tão diferentes por dentro e por fora que não nos conseguimos compreender. Já nem tentamos. Cada tentativa parece que não surte efeito. E cada vez fica mais doloroso tentar. Habitamos o mesmo espaço e mal nos falamos. Poder-se-ia dizer que se deve aos horários diferentes, mas não. Apenas não sabemos o que dizer. Ambos sabemos que os nossos mundos são diferentes, as aspirações não são as mesmas, os gostos pouco se misturam. Separa-nos tanto, que o laço familiar que nos une não funciona senão como uma cola que suspende uma das partes para impedir apenas que se estatele no chão.
Há uma frieza na casa. Resulta da sua ausência. Ela animava a casa. Mesmo nos últimos momentos, era o íman que nos unia e nos fazia a família. Agora, nenhum de nós consegue ser esse íman. Nenhum de nós se calhar ama o outro incondicionalmente. Andamos à deriva sem saber o que fazer da nossa dor, da nossa mágoa, de não compreendermos, de não nos deixarmos compreender.
Nesta casa já não há cheiros harmoniosos de vida. Há cheiros assépticos de detergentes com aromas florais. Não há o calor dos afectos. O nosso lar perdeu-se a cada passagem de pano, a cada tentativa de dar brilho a esta casa. Limpou-se o pó e cada memória que trazia.
É uma casa vazia, sem vida a despontar. Apenas vamos sobrevivendo entre estas paredes que outrora albergaram uma família. Hoje, apenas acolhem duas pessoas sem rumo e cada vez mais em rota de colisão.
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