Ler Ferreira de Castro 40 Anos Depois

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11.11.09

diálogo friorento

-         hoje, demorei mais de 20 minutos no duche.
-         E?
-         Não é normal. Demoro, quando muito, cinco minutos.
-         Isso não é um banho, é passar o corpo por água.
-         É tempo mais que suficiente para lavar o cabelo e o corpo. Não ando a cavar terra para andar imunda.
-         Então, demoraste 20 minutos. qual é o problema? Estava a saber-te bem e aproveitaste.
-         O problema é que no meio do duche finalmente percebi porque é que também ando a dormir tanto e porque é que quando chego a casa visto quase logo o roupão.
-         Andas cansada, precisas de relaxar.
-         Não, não é isso. É pior. É porque não tenho calor na minha vida. Por isso recorro ao calor do duche, da cama, do roupão. Para sentir calor. Para me sentir aconchegada, reconfortada.
-         És friorenta. Não é nada demais.
-         Não, não sou friorenta. Sou sozinha, sabes há quanto tempo ninguém me abraça? Eu já nem me lembro quando foi a última vez.
-         Tadinha. Precisas de um abraço. Anda cá que isso resolve-se.
-         Desculpa, mas não se resolve com os teus abraços, por mais bem intencionados que sejam, apesar de ajudar sempre. Obrigada. Sinto falta de um abraço a meio da noite, tem de ser o calor de um corpo ao meu lado no sofá em silêncio ou a partilhar os acontecimentos do dia. Tem de ser uma mão a ajeitar-me os caracóis e a acariciar-me o pescoço.
-         Compreendo. Realmente esse calor não te posso dar lamento.
-         Também eu. Infelizmente, a conta da água este mês vai ser grande. 

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