Vivi grande
parte da minha vida na Praceta Ferreira de Castro, em Agualva. Foi um óptimo
lugar para se viver uma infância: tinha um parque infantil e um jardim. O parque,
aquando do programa Polis, deu lugar a um estacionamento. O jardim foi perdendo
ao longo da duas últimas décadas o esplendor de outrora, em que era o único
jardim da freguesia e o cenário das tradicionais fotos de casamento.
A praceta
foi habitada, na década de 60, por muito casais oriundos da migração do
interior do pais, em busca de melhores condições de vida do que as que teriam
na exploração dos pequenos terrenos agrícolas familiares. Aqui, cresceu uma
geração de rapazes (eram quase 30), entre os quais os meus irmãos (nós,
raparigas, éramos em menor número), que se reuniam nos seus bancos, sempre sob
o olhar de uma qualquer vizinha. O jardim era um espaço familiar, vigiado (pelo
olho de falcão da D. Ana e restantes vizinhos) e respeitado.
Mas as
gerações crescem e vão à sua vida fora da praceta. Alguns vizinhos mudam-se,
outros despedem-se desta vida. As casa recebem novos moradores. Moradores para
quem a praceta é o local onde dormem e não o local onde os seus filhos crescem
em comunidade na rua. Pessoas com outros valores que não o de vigiar um jardim
que o descaso de uns, a falta de empenho de outros e o vandalismo de estranhos
foi votando ao desleixo.
Que solução
para este local? Muitos gostariam apenas de vê-lo transformado em mais lugares
de estacionamento. Esquecem que o verde, uma vez perdido, nunca mais retorna. Outros,
a velha guarda, querem o esplendor de há 45 anos. Desenganem-se. O tempo segue
em frente e já nada será como era e há que perceber que a solução não pode
passar só pela afectividade, que também não pode nem deve ser negligenciada
pelos decisores. No entanto, é possível devolver a dignidade a este espaço.
Eu acredito
na valorização deste espaço. Terá de ser um jardim renovado, mas diferente de
outras décadas. Hoje, os valores e as prioridades são outros.
Hoje, as
novas gerações crescem dentro de 4 paredes em frente aos computadores. As mães
e avós trabalham a tempo inteiro. Isto é, se não estiverem à procura de um
trabalho, o lhes ocupa igual tempo. Hoje, o medo da violência e represálias de
uns quantos vândalos impede a resistência dos mais velhos. Hoje, os valores da
cidadania são praticados mas só a nível das exigências e não no que está ao
nosso alcance e à nossa frente: a preservação de um espaço que é de todos.
Sempre que
retorno à praceta onde os meus pais se estabeleceram após o casamento, criaram
três filhos e fizeram amizades de toda uma vida, fico triste com o estado do
meu jardim. Tecnicamente, não sei quais as melhores soluções, mas sei que já
todas foram apresentadas. O meu senso diz-me que a vigilância e cuidados
regulares, a rega e a plantação apropriadas darão os seus frutos. Talvez demore
ainda uns meses a ver os resultados desejados. Mas também acredito que um
jardim cuidado possa fazer com que novas gerações voltem a sentir o afecto que
todos sentimos.
Se mais não
posso pedir, posso, no entanto, dar este testemunho. Peço a todos que lutem por
este espaço que é de todos e para que este venha a ter um novo esplendor. Merece
a freguesia e merecemos todos nós que aqui residimos e trabalhamos.
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